Por Viviane Freitas | 3 agosto, 2021 - 10:41
O rio Paraguai, um dos principais cursos d´água que alimenta o Pantanal, enfrenta a sua pior estiagem em 54 anos. Após um 2020 com chuvas bem abaixo da média e assolada por queimadas, a tendência é que o nível do rio atinja índices cada vez mais críticos neste ano. Medições feitas pelo Serviço Geológico Brasileiro (SGB), que estuda os níveis de água da maior área alegável do mundo, apontam que a profundidade do Paraguai em Cáceres está com 1,18m de profundidade.
Segundo o pesquisador do SGB, Marcelo Parente Henriques, a vazante do Paraguai, como é chamado o período em que o rio começa a diminuir, iniciou dois meses mais cedo – o que indica que a estiagem também começou antecipadamente. O ponto do rio em Cáceres deveria estar com cerca de 2,5 metros, mas, conforme a última medição, está quase 1,5m abaixo do normal.
Há sete dias, a cota bateu em um metro e, nesse mesmo período do ano passado, estava em 1,19m. As chuvas dos últimos dias, levadas pela frente fria que chegou a Mato Grosso, fez com que o nível tivesse uma leve subida. Mas, conforme boletim do SGB dessa sexta (18), a tendência é que a profundidade continue a cair. A menor cota registrada no ano passado foi de 50cm em 10 de outubro. Marcelo diz que a situação é preocupante. Se o nível do rio atingiu esse índice logo no início do período de estiagem, que vai até meados de outubro, a tendência é que o Paraguai diminua ainda mais.
Não só em Cáceres, mas ao longo das sete estações do SGB ao longo do rio. “Elas estão em uma área de zona de atenção de mínimas. Cáceres, particularmente, está registrando a pior condição da série inteira, em 54 anos de registros de dados”, traz o pesquisador. A seca do rio Paraguai em Cáceres relembra a estiagem sofrida entre os anos de 1967 e 1973.
Inclusive, o jornal Estado de Mato Grosso, de novembro de 1969, trazia uma manchete alarmante de que o Pantanal estava secando, o que prejudicaria a criação de gado. Marcelo comenta que as notícias da época mostram que não é a primeira vez que o Pantanal passa por um período de seca severa e que a atual estiagem deve ser visto com cautela. Isso por que o Pantanal pode voltar a encher. Foi o que aconteceu entre 1973 e o ano seguinte.
Em novembro daquele ano, a imprensa ainda se alarmava com a “seca do Pantanal”. Mas, três meses depois, precisamente em março de 1974, as chuvas foram acima da média, encheram o rio Paraguai e fizeram com que o Pantanal voltasse a ser alagado. A reportagem da época aponta que casas foram invadidas pela água, pessoas ficaram desabrigadas e cidades ao longo do rio foram duramente atingidas.
No entanto, Marcelo explica que as chuvas do fim do ano passado e início de 2021 foram insuficientes para inundar o Pantanal. A estiagem já leva os pesquisadores a crer que esse vai ser o terceiro ano de seca no bioma. Esse cenário traz o risco da região ser assolada e destruída pelas queimadas, como no ano passado, quando cerca de 40% da região foi destruída pelo fogo.
O Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe) prevê chuvas de pequena intensidade sob a bacia nas próximas semanas, mas elas não serão significativas para encher o rio, indicando que o Paraguai apresente tendência de declínio na maioria das estações de medição. Abaixo da média Marcelo aponta que, na última década, tem sido comum que as chuvas se intercalem com períodos de seca.
Em 2011, 2012, 2013, 2015 e 2019 foram os anos que choveram acima da média na Bacia do Pantanal. Já em 2014, 2016, 2017, 2018 e 2020 foram às maiores baixas. “Mas de 2019 para cá, a precipitação sempre para abaixo da média. Abaixo mesmo”. Para os pesquisadores do SGB, a estação referência de medição do rio Paraguai é de Ladário, que fica em Mato Grosso do Sul. Isso por que ela tem quase 122 anos de dados (o aniversário é em dezembro).
Durante sua trajetória, ela já conseguiu identificar secas nos anos de 1944, 1936 e 1915. Se o nível do Paraguai ultrapassa quatro metros, pico considerado normal para a época, quer dizer que o Pantanal está em uma situação normal de cheia. Contudo, o nível do rio registrado nessa sexta é de 1,56m, ou seja, quase três metros abaixo do esperado. A última vez que o ponto do Paraguai em Ladário ultrapassou o pico foi em 2018, quando o rio chegou a 5,35m, no dia de 15 junho. “Desde então boa parte da planície não tem inundação, sofrendo com os impactos causados pelas últimas secas”, pontua Marcelo.
Em quase 10 anos acompanhando o nível do rio Paraguai, é a primeira vez que ele se depara com uma baixa tão histórica. “O bioma que no ano passado sofreu com uma das maiores secas já registradas na região, nesse ano se vê novamente exposto a uma condição semelhante e que pode ficar mais difícil”, pontua.
O rio Paraguai, que nasce em Alto Paraguai, é alimentado pelas chuvas que caem nas cabeceiras de cursos d’águas do Planalto de Guimarães e Parecis, como os rios Cuiabá, Coxipó, Jauru, São Lourenço e demais córregos e nascentes da região. Ele percorre uma região de transição entre a Amazônia e o Cerrado e entra pelo lado pantaneiro, uma área de depressão e plana, por Cáceres. De lá, escoa para o sul e vai para o Paraguai, integrando ao sistema da bacia da Prata.
Impactos da estiagem Segundo Marcelo, mesmo que chova intensamente, é improvável que o Pantanal fique coberto de água. Isso por que a região é muito plana, o solo é arenoso e infiltra com muita facilidade, explica o pesquisador. “O que define o pulso de cheia é exatamente a intensidade de chuva na região no final do ano – de outubro até abril”, pontua.
O pesquisador ressalta que ainda não dá para afirmar a estiagem tenha interferência da ação humana ou do aquecimento global. “Não pode afirmar que está ligado a isso. Já houve registros de longos períodos em níveis baixos”, disse. Contudo, Marcelo aponta que, para a preservação do ciclo de cheias do Pantanal, é necessária a preservação das florestas nas bordas do pantanal.
O pesquisador também chama atenção para a dificuldade de captação de água e até de um possível desabastecimento na região. Em Poconé, cerca de 30 comunidades pantaneiras já sofrem com dificuldades no abastecimento de água. A estiagem em todo o rio Paraguai também deve prejudicar a navegação fluvial. A Marinha recomenda aos comandantes que observem se a embarcação condiz com o nível do rio. Isso por que é deles a responsabilidade de navegar com o rio em cota baixa. A Agência Fluvial aponta que a baixa profundidade impede o tráfego do rio.
25 novembro, 2024
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